Enciclopédia do caso Evandro

EXTRAS EPISÓDIO 24

Como citado no episódio, as matérias escritas pela jornalista policial Mara Cornelsen em 2011 foram um dos pontos de partida para a pesquisa deste podcast. Originalmente, as matérias estavam no extinto site do portal Paraná Online, que hoje é direcionado para o site do jornal Tribuna do Paraná. Não conseguimos localizar as matérias online desde que ocorreu essa transição de domínios. Por conta disso, disponibilizamos os PDFs das matérias para download neste link aqui, em um PDF único. 

 

A DENÚNCIA DE ACORDO COM DIÓGENES

De acordo com Diógenes Caetano dos Santos Filho, no dia 6 de Abril de 1992, entre 9h30 e 10h00 da manhã, Evandro estava na escola e pediu para a mãe, que era funcionária do local, se podia ir para casa tomar café. A casa ficava perto da escola e a mãe deu a chave para o filho ir. Nesse período, ele foi sequestrado por Celina Abagge e Beatriz Abagge e levado para uma casa, onde o menino ficou até o meio-dia, enquanto eles não podiam levá-lo para a serraria.

Bardelli então foi até a serraria e dispensou todos os funcionários a partir do período da tarde e por todo o restante da semana. Evandro então foi levado até a serraria e ficou amarrado dentro de um escritório, ficando lá desde a tarde desta segunda-feira até 19:00 do dia seguinte.

O ritual então foi realizado e, após o término, as vísceras do menino foram colocadas no alguidar que foi colocado na casinha, onde deveria ficar durante três dias e depois ser jogada em água corrente. Após esse período, eles voltam para pegar as vísceras e jogar nos fundos da serraria onde havia água corrente. Jorge Peres, um pescador que estava no local, encontra a sacola com as vísceras, chegando até mesmo a ver as mãos de Evandro. Assustado, acabou largando a sacola na água. O pescador voltou para o local mas a correnteza da maré já havia levado a sacola para longe.

[DOWNLOAD] Depoimentos dos acusados (2 e 3 de Julho de 1992)

 

 

28 DE DEZEMBRO DE 2016 – UM DIA EM GUARATUBA

Dirceu, um morador de Guaratuba, que reside perto do local onde o corpo foi encontrado, contou que sua mãe, Terezinha Norberto Santos, era funcionária da serraria Abagge e confirmava que naquele dia os funcionários realmente foram dispensados pelos Abagge durante uma semana. Ela dizia que trabalhou por quase dois anos na serraria e dizia que “fazia de tudo um pouco” no estabelecimento e que todos os funcionários trabalhavam dessa forma.

Terezinha conta que Aldo era um bom prefeito e uma boa pessoa, ao contrário de sua esposa e de sua filha. Ela também chegou a trabalhar numa horta do Aldo, que chegou a providenciar até mesmo uma geladeira, fogão e utensílios para que as pessoas que trabalhavam na horta pudesse se alimentar, Terezinha lembra que Celina tirou o fogão do local. Ela não lembra da administração de Diógenes, principalmente porque não é natural de Guaratuba.

Ainda de acordo com ela, no dia 6, uma segunda-feira, ao chegar para trabalhar na serraria, ela lembra que o local estava cheio de pipoca estourada espalhada pelo chão. Depois de um tempo, a polícia chegou procurando por Evandro. No dia anterior, quando deu 18h00, o Airton Bardelli fechou a serraria e mandou os funcionários para casa, o expediente normalmente ia até às 20h00. No dia seguinte, os funcionários voltaram ao trabalho normalmente, o corpo de Evandro já havia sido encontrado e a polícia chegou novamente no local perguntando pelo menino.

O relato de Terezinha é confuso, devido aos anos desde que os fatos aconteceram, não foi possível confirmar se eles ocorreram em maio ou junho e se realmente Bardelli deu uma semana de folga para os funcionários como Diógenes afirma. Ela mistura datas e fatos e fica difícil de se tirar qualquer conclusão mais segura.

 


O RELATO DE JORGE PERES 

Jorge Juliano Peres (conhecido como “Jorge Banana”), um pescador e pedreiro, morava perto da antiga serraria Abagge. Ele lembra da confusão de gente dentro da serraria, incluindo policiais, na época do desaparecimento de Evandro e foi quando ele ficou sabendo do assassinato do menino. Jorge foi pescar alguns dias depois e um pedaço de madeira chamou a sua atenção, ao se aproximar notou que junto da madeira havia um pacote e dentro dele as vísceras, mãos e cabelo de Evandro, o estado de putrefação era tão grande que na hora o pescador cogitou que poderia ser até mesmo um feto abortado e chegou a comentar o caso com a sua esposa. Ela insistiu que eles voltassem para lá mas já era tarde, a maré havia subido e o pacote com o corpo já não estava mais lá.

Um tempo depois, assistindo ao programa do Alborghetti na televisão, ele ouviu sobre o caso e sobre mais detalhes sobre o caso e os detalhes sobre o assassinato, foi quando ele se deu conta do conteúdo do pacote que havia encontrado naquele dia enquanto pescava no rio. Jorge conta que não chamou a polícia na hora que encontrou o pacote porque para fazer isso era necessário pagar e ele queria chamar mais pessoas para examinar o pacote antes de chamar as autoridades, com a intenção de ter mais testemunhas e certificar que aquilo era mesmo restos mortais de uma pessoa.

Ele conta também que diversos amigos viram o menino no carro ou ouviram seu choro, chegando a citar a Davina como uma dessas testemunhas e também fala sobre Tristão da Silva Miranda, a pessoa que viu Evandro entrando no carro com as Abagge.

Na época Jorge era amigo de Diógenes e chegou a morar por muitos anos lado a lado.

 

 

SOBRE EDÉSIO

Edésio diz ter certeza que viu Celina e Beatriz levando o Evandro no carro delas e é testemunha de acusação das Abagge. Não quis que sua entrevista fosse gravada mas relata que por conta do seu testemunho começou a ser ameaçado na época, chegando a ser ameaçado por três pessoas ligadas a família Abagge e falou bastante sobre Aníbal Khury e como ele tentava proteger a família Abagge devido ao poder que tinha na época. Essas três pessoas seriam: João Carlos Anderson, outro João Carlos* e por último Arildo da Silva.

Edésio conseguiu gravar  as ameaças e com a ajuda de um professor de direito chamado Francisco levou na fita até Curitiba para falar com o Procurador-Geral do Estado. O Procurador-Geral chamou a polícia militar e o caso foi até o delegado de Guaratuba. Os três homens foram presos por terem feitos essas ameaças mas ficaram apenas alguns meses presos, como exceção de João Carlos*, que já havia assassinado outras pessoas antes e tinha um problema registrado em João Pessoa.

*Na verdade, Edésio se referia a João Batista Pessoa dos Santos Filho

 

 

SOBRE O TESTEMUNHO DE JORGE JULIANO PERES

A primeira vez que ele aparece nominalmente no processo é por conta de uma declaração que ele prestou via escritura pública registrado em um cartório em São José dos Pinhais, cidade em Curitiba, cuja comarca foi o local onde foi realizado o júri de 1998. Essa declaração é datada de 1º de outubro de 1997 e nela é possível ler o relato sobre o dia que ele encontrou o pacote com as mãos deformadas que pareciam ser de uma criança, pedaços de vísceras e cabelos loiros.

[DOWNLOAD] Primeiro relato de Jorge Peres, em cartório, de 1 de Outubro 1997

 

Em 6 de abril de 1998 na comarca de São José dos Pinhais, Jorge Juliano Peres prestava seu depoimento em júri. Lendo os autos do julgamento, temos a impressão que ele é usado mais para tentar mostrar que a Polícia Civil estaria tentado ajudar as Abagge do que solucionar o caso. 

[DOWNLOAD] Depoimento de Jorge Peres no júri de 1998

 

Em certo momento, enquanto ele foi interrogado pela primeira vez pela juíza Marcelise Weber Lorite, ele afirmava que “esteve na casa do informante um delegado baixo, entroncado, de cabelos pretos e que ele assevera que foi de 8 a 10 vezes depor na delegacia”. A partir dessa informação, quando a acusação passou a questioná-lo, ele reafirma ter estado 8 ou 9 vezes na delegacia e que deu mais de uma declaração assinando-a, o Ministério Público pergunta se o delegado que o procurou tinha barba e ele confirmou. Ele também diz que nunca esteve em nenhuma outra delegacia além da de Guaratuba e que ao mostrá-lo uma fita de vídeo com uma matéria jornalística na parte em que consta o delegado Luiz Carlos de Oliveira prestando declarações ele afirma que aquele homem tem as características físicas do delegado que esteve na sua casa e tomou seu depoimento.

Mais adiante os advogados de defesa também buscam desacreditar o relato do homem, como podemos conferir quando o perguntam se ele já falou com o promotor Antonio Cesar Cioffi de Moura e  Jorge respondeu que não se recorda e quando mostrada uma foto de matéria jornalística onde aparece uma foto do Dr. Cioffi, Jorge diz que não se recorda de tê-lo visto. Após isso foi lido matéria jornalística que afirma que ele procurou pelo Dr. Cioffi para contar o relatado mas ele, no entanto, não se recorda de ter procurado o promotor.

Essa matéria é uma que consta no jornal Tribuna do Paraná de 29 de julho de 1992, no qual na primeira página é possível ler “Ritual satânico: e os bruxos negam tudo”. Em certo trecho da matéria está descrito todo o relato de Jorge Perez sobre o dia que ele encontrou no rio o pacote com partes do corpo de Evandro e sobre ter contado o ocorrido para a sua esposa, que o aconselhou a não revelar nada a ninguém, para não se envolver em confusão.

 

Capa do jornal Tribuna do Paraná, de 29 de Julho de 1992. A imagem está ruim porque foi retirada dos autos digitalizados.

 

 

Trecho da matéria de capa do jornal Tribuna do Paraná de 29 de Julho de 1992. A imagem está ruim e cortada porque foi retirada dos autos digitalizados do processo.

 

 

Ao final do julgamento os sete jurados entenderam que Jorge estaria falando a verdade, apenas Edésio foi considerado como tendo prestado falso testemunho. O questionamento que fica é: se os dois eram tão próximos da família de Evandro porque não falaram reservadamente com os pais do menino?

Vale lembrar que o que absolveu as Abagge no júri de 1998 não foi a alegação de não autoria ou as alegações de tortura mas sim o convencimento aos jurados de que o corpo encontrado no matagal dia 1 de abril de 1992 não era o de Evandro Ramos Caetano.